sábado, 21 de dezembro de 2013

DE VOLTA À SECRETARIA DE ESTADO DA SAÚDE - MG


Dia 18 retornei à Secretaria de Estado da Saúde de MG para obter a dispensa de medicamentos. Já "escolado", peguei a senha do segundo andar e fui verificar o número de pessoas. Umas dez, na sala de espera, o suficiente para sair, ir buscar o medicamento no primeiro andar (os que são regularmente disponibilizados pela Farmácia de Minas, sem a necessidade de processo judicial) e voltar. 

Deu certo. Lá em baixo ganhei prioridade por ter feito hemodiálise, marquei o retorno, recebi os remédios, voltei ao segundo andar e fiquei esperando. Trinta minutos de cadeira e fui recebido por um dos servidores, que estava acompanhado por um senhor que observava os atendimentos (estaria aprendendo? seria alguma espécie de fiscal? não me senti à vontade para perguntar).

Como até o momento o terminal de computador (considerado o "juiz", em vez da sentença judicial, pelos servidores deste setor) ainda apontava a dispensa de um vidro de cinacalcete por mês, recebi novamente a proposta-imposição: iria levar dois vidros por dois meses. Eu lhe disse, urbanamente, que fizesse o que achasse melhor.

O servidor se incomodou com a receita, afinal, ela pede três vidros por mês. Leu o papel e me perguntou se havia entrado em contato com a advogada. Eu já estou cansado de explicar o óbvio e ser tratado como incompetente ou mentiroso, então lhe respondi: - Não adianta. Optamos pela via judicial.

Ele me perguntou se eu estava sendo assistido pela defensoria pública. Respondi-lhe que não, que tenho um advogado particular. Ele perguntou se o recurso já tinha sido encaminhado ao juiz. Disse que sim, e o assunto morreu por aí.

Desisti de apresentar a sentença judicial e de pedir que entrasse em contato com a advogada do estado, que lessem-lhe o papel e que lhe pedissem para autorizar o que já estava ordenado. Como diz o quadrinho aí em cima, lá é apenas a dispensação, e eles não têm por função, papel ou obrigação, entrar em contato com as pessoas que definem o que eles próprios devem fazer.

Graças a esta cultura burocrática, a cultura da função, tenho que voltar ao juiz, avisar-lhe que não está sendo obedecido e aguardar que estabeleça novas penalidades para a secretaria, notifique-a e faça-a cumprir sua obrigação. Uma conversa seria suficiente para a resolução deste impasse, mas um número de telefone que não recebe ligações é o único canal disponível para a solução pelo diálogo, e não há intermediação possível.

Não lhe disse que acionei a Ouvidoria Geral do Estado e a Comissão de Saúde da Assembleia Legislativa. Para quê? Isto só o colocaria na defensiva, e meu problema continuaria sem solução.

Recebi dois vidros de cinacalcete. Lembrei mais uma vez do relatório da minha médica no processo:

"Em maio de 2013, iniciou o uso de Cinacalcet (dose inicial de 30 mg/dia) com boa resposta inicial à medicação e redução do PTH (1380 pg/ml para 1091 pg/ml). Solicito liberação da medicação (90 mg/dia) para continuidade e otimização do tratamento".

Estamos em dezembro, e o tratamento em dose inferior à dose de ataque não foi suficiente para obter a redução necessária do PTH. Nos últimos exames, ele já estava na casa dos 1700 pg/ml). Um retrocesso, que espero conseguir reverter no futuro, quando algum dos cursos de ação empreendidos for bem sucedido.

Desejei feliz natal ao suposto Cristiano. Ele me olhou com alguma surpresa. Desejou-me feliz natal também. Agora voltarei apenas em fevereiro, a menos que aconteça alguma coisa antes, mas virão as férias forenses, e a novela vai continuar.


quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

MAIS UMA TARDE NEGRA NA SECRETARIA DA SAÚDE



A tarde estava chuvosa quando cheguei às 15 horas na Secretaria. Levava uma ordem judicial já vencida, um relatório médico, receitas, um documento com o agendamento, explicando que eu havia recebido uma quantidade menor de remédios que a que eu alegara estar escrita na ação judicial e que voltaria para tentar a dispensa do resto do medicamento necessário ao tratamento.

Os cidadãos que entram na justiça contra a secretaria recebem um tratamento de segunda. Segundo andar, quero dizer. Lá em baixo, no processo normal, recebemos um papel indicando que medicamentos, doses e datas de dispensação estão sendo realizados. No segundo, não. Um papelzinho, dizendo: volta no dia x. 

Curiosamente, já me explicaram que o cidadão tem o direito de receber as decisões dos órgãos por escrito, para a defesa dos seus direitos. Está na constituição. Mas não saiu do papel nem entrou na mente dos funcionários que trabalham no segundo. 

- Isso não significa nada para mim! Ouvi. Era uma referência à cópia da ordem judicial que levei, na esperança de diálogo. 

Não houve diálogo. Eu deveria conversar com a advogada do caso, da parte do Estado. Mas o telefone dela não atende nunca. Nem sequer é um telefone fora do gancho. Ouve-se a voz eletrônica dizendo: "Não foi possível completar a sua chamada..."

Então é um problema sem fim. A funcionária me ofereceu dois vidros de remédio, desde que eu só voltasse daí a três meses... Quando disse que não estava entendendo, e que se esta fosse a condição, eu nem iria recebê-los, ela os arremessou (raiva?) para a estante que ficava atrás. 

Quando disse que ela não me oferecia opção, que eu teria que registrar um boletim de ocorrência para assegurar meu direito, ela não se incomodou. Creio que disse que fizesse o que achasse correto.

Eu já havia visto outras "cenas de guerra", antes da minha. Coisas que tocariam qualquer um. Uma senhora com o abdômem volumoso, ordem judicial, dois filhos adultos, sendo procrastinada há alguns dias, inicialmente por falta de uma procuração. Depois porque a Secretaria estava providenciando um lugar para o medicamento ser aplicado. Uma jovem estava buscando um aparelho que regulava as doses de insulina, portadora de diabetes 1, com histórico de complicações. Foi tratada aos berros, quando começou a chorar e revoltou-se por dizer que o próprio funcionário que havia escrito para ela retornar, negava o conteúdo com a letra de próprio punho.

O que mais me incomodou foi o olhar dos outros. Mais de dez pessoas na sala de espera, e o olhar entre elas era como se nada estivesse acontecendo. Entendi que ninguém queria se envolver, nem com um olhar de compaixão. Imagino que estivessem pensando como eu, que dependeria no futuro dos funcionários, então era melhor ficar calado para não ser retaliado.

Nas conversas, lembrei dos judeus na mão da SS. Um dizia que a funcionária X tratava a todos bem, mas que o funcionário Y tratava mal. E os nomes variavam nas bocas dos interlocutores, que falavam isso a meia voz. A SS levava os judeus para o extermínio nas florestas, antes da "solução final". Eles dividiam pais, filhos, irmãos, vizinhos em duas filas. Todos ficavam na esperança de que apenas uma das filas teria um desfecho funesto. Na verdade, todos eram executados. Comecei a pensar se o mecanismo psicológico não seria o mesmo.

Chegaram os policiais, chamados através do eficiente 190.

Eles queriam negociar, intermediar o conflito e resolvê-lo com diálogo (eu também....) Foi infrutífero. A funcionária recusou até mesmo a oferta que havia feito (dar três vidros por três meses), e disse que tinha que ir para casa, que estava cansada. Devia estar mesmo, mas com certeza não havia feito hemodiálise pela manhã, nem usava uma bomba de heparina no corpo, e não me parecia que teria câncer. Informaram aos agentes da lei que não havia responsável presente. Engraçado! Na UFMG, na falta de uma autoridade, responde a imediatamente superior, na falta dela, a imediatamente inferior. Ali, não. É uma repartição irresponsável, quero dizer, sem responsável, afinal, já eram cinco da tarde (e ninguém tinha nada a ver com o fato de eu ter chegado às três).

Pedi uma cópia da tela de computador que indicava que eu tinha direito a apenas um vidro do medicamento. Negada. Afinal, eu não devo mesmo ser cidadão, sou alguma espécie de sub-cidadão que fica demandando na justiça contra o estado por uma questiúncula, como a minha saúde pessoal. Fico pensando se tenho mesmo direito, se a sentença judicial não é um delírio, causado pela minha doença de base.

Terminei o dia em uma companhia de polícia, registrando o boletim de ocorrência, sem a presença de representante da Secretaria. Apenas a minha versão, e a de minha colega, que ficou sem um dos sensores necessários ao seu tratamento. Ela terá apenas mais dez dias de aplicação correta de insulina. E depois?

Depois não é problema dos servidores da secretaria...